De São Paulo
Reduzir o uso de gases-estufa menos conhecidos, como o óxido nitroso
(N2O) usado na agricultura e em processos industriais, pode ser uma
dessas oportunidades.
O problema nas negociações internacionais, como a recente rodada de
Varsóvia, na Polônia, "é que não se avança em nada enquanto todo o resto
não estiver decidido", diz Steiner. "Ficaremos nisso, em que nada é
feito até que tudo seja acertado, ou dá para reconhecer que há algumas
abordagens práticas que podem ser agilizadas?", questiona. O alemão
Steiner, que nasceu em Carazinho, no Rio Grande do Sul, falou ao Valor
nas últimas horas do encontro de Varsóvia, a CoP-19. Veja a seguir
trechos da entrevista:
Valor: Como avançar nas negociações internacionais sobre mudança do Clima?
Achim Steiner: Não se esperava que a CoP-19, de Varsóvia, produzisse
decisões, mas o encontro tinha que criar uma rota de confiança para um
acordo na CoP de Lima e em Paris, em 2015. Há expectativa em relação ao
encontro organizado pelo secretário-geral Ban Ki-moon em 2014, em Nova
York. Agora, o que tem de acontecer, claramente, é um briefing político
aos negociadores. A mensagem que eles têm que levar para casa é
dramática: no cenário atual, será muito difícil conseguir um acordo
significativo. É preciso repensar como abordar essa questão.
Valor: Como fazer com que as sociedades se apropriem desse debate e participem mais?
Steiner: Três coisas: a primeira é mostrar que o momento da oportunidade
de agir está desaparecendo e que tempo é crucial nesse assunto. Em
segundo lugar, entender que não agir é muito caro. As pessoas sempre
falam sobre o custo da ação, mas em cada lugar que olhemos, hoje, o
custo da inação é muito mais alto. É preciso corrigir essa percepção. E
em terceiro lugar, fazer com que as pessoas confiem que agir na mudança
climática significa oportunidades em Florestas, em energias renováveis, em formas de reduzir a Poluição. Isso quer dizer empregos. A ideia de que combater a mudança do Clima
irá, de algum modo, evitar o desenvolvimento é um conceito equivocado,
mas as pessoas acreditam nisso. Se essas três coisas - urgência, custo
da inação e oportunidades - chegarem ao debate doméstico, veremos mais
pressão do público, da sociedade civil, das indústrias, do comércio, dos
governos locais. E isso dará base para que os governos possam dar
passos maiores na direção de um acordo global.
Valor: O que o senhor achou da decisão do Japão, de voltar atrás em suas metas de reduzir Emissões?
Steiner: Tenho muita compreensão e empatia pelo dilema japonês e entendo
que há um inquestionável desafio de curto prazo. Aconteceu aquele
tremendo desastre [de Fukushima], que seria um desafio imenso para
qualquer país. Só acho que é difícil entender a forma e o momento em que
esse anúncio de aumentar as Emissões
foi feito. Quanto mais puderem explicar a decisão, mais ficará claro
que não estão saindo dos compromissos já assumidos. O Japão tem
histórico de ser um país ambicioso em tecnologia, de procurar fazer bom
uso dos recursos naturais, reduzir Poluição,
ter eficiência energética. O mundo costuma ver o país como líder e
pioneiro. Espero que a mensagem do Japão seja: "Olha, temos um desafio
de curto prazo, mas também temos um compromisso grande como uma das
lideranças mundiais em combater a mudança do Clima".
Valor: Como o senhor vê o acordo bilateral entre os Estados Unidos e a
China de eliminar o uso e o consumo de gases HFCs? Vai na mesma linha
que os estudos do Pnuma sobre reduzir a emissão de N2O?
Steiner: O primeiro ponto é que esses são gases do efeito estufa que estão sob a Convenção do Clima
e a discussão, então, pertence a esse fórum. Sobre o relatório do
Pnuma, bem, nós acreditamos na necessidade urgente de agir e essas
substâncias são prioridades, o objetivo é colocar foco nos estudos
científicos sobre esses tópicos para os tomadores de decisão. Nosso
papel não é determinar como os governos deveriam agir, mas mostrar a
eles que estão perdendo uma chance. A minha interpretação pessoal é que
alguns países em desenvolvimento teriam que estudar quais são os custos
de acabar com esses gases, porque os industrializados estão prestes a
fazer a transição. O problema nas discussões sob a Convenção é que não
se avança em nada enquanto todo o resto não estiver decidido.
Valor: Isso é problema?
Steiner: Sim porque ficaremos nisso, em que nada é feito até que tudo
seja acertado, ou dá para reconhecer que há algumas abordagens práticas
que podem ser agilizadas? Esse é um desafio nas negociações
internacionais que irá exigir boa vontade e pragmatismo. Acho que o
sinal que os presidentes Xi Jinping e Barack Obama deram de desacelerar a
produção e o consumo de HFCs é o reconhecimento de que existe uma
oportunidade e temos que encontrar uma maneira aceitável de
concretizá-la.
Valor: Há esta grande lacuna entre o quanto os cientistas dizem que é
preciso cortar na emissão de gases-estufa e as promessas dos países.
Como as conferências do Clima podem avançar?
Steiner: O que está claro no relatório do Pnuma "Emissions Gap 2013" é
que a chance de fechar essa lacuna começa a desaparecer. Mas há
oportunidades em muitas áreas. Na redução de outros gases-estufa na
agricultura, por exemplo. Há muitos caminhos a trilhar, acredito que
somos capazes de resolver isso. Bem, as pessoas associam essas
conferências do Clima
com paralisia e impasse. Mas elas também mostram que há milhares de
pessoas construindo a nova economia de baixo carbono. São prefeitos,
empresários, governos locais, ministros de energia, líderes comunitários
do Sul e do Norte.
Valor: O que o senhor achou da saída das grandes ONGs da conferência de Varsóvia?
Steiner: Nessas negociações, de tempos em tempos, algum país ou grupo de países se retira. Agora foram as ONGs que expressaram claramente sua frustração com esse processo tão complicado. Respeito isso. Principalmente das ONGs
que estão aqui, que investiram tempo, dinheiro e energia em compreender
e participar desse processo. Elas têm o direito de estar nele, de se
retirar, e também têm a oportunidade de voltar. (DC)
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