15 de julho de 2012
Pesquisadores da UFBA vão testar biodiesel em viagem interoceânica
Pesquisadores da UFBA vão testar biodiesel em viagem interoceânica
Entre os dias 11 e 31 deste mês de
julho o Laboratório de Energia e Gás da Universidade Federal da Bahia
(LEN) e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Energia e
Ambiente (INCT E&A), em parceria com Instituto Surear para a
Promoção da Integração Latino-Americana, realizarão a Travessia
Interoceânica B100. O projeto utiliza dois veículos Ford Ranger XLT 3.0
Diesel, cedidos pela Ford Motor Company Brasil, um deles abastecido com
B100, combustível renovável de origem vegetal (o combustível
convencional, B5, utiliza apenas 5% de biodiesel na mistura) para
percorrer a distância entre as cidades de Salvador, na Bahia, e Ilo, na
Costa do Peru.
Durante o trajeto
serão coletados dados sobre a performance, rendimento e emissões do
motor com o biocombustível, além das condições das estradas, através de
vídeos, fotografias, mapeamento eletrônico, relatórios escritos, etc.
Quando do retorno, os veículos serão submetidos a estudos e testes para
avaliar o desgaste e desempenho após a jornada de 13.000 km.
Através da realização desse projeto, os pesquisadores esperam dar início à formação de um grupo de pesquisa regional sul-americano sobre a temática da bioenergia (BIO10), além de chamar a atenção para o potencial de expansão dos biocombustíveis na matriz energética regional, através do incentivo a pesquisas na área. Em segundo plano, busca-se incentivar o desenvolvimento de técnicas e tecnologias sustentáveis, eficientes e inovadoras, que estejam em consonância com a perspectiva da integração regional sul-americana, notadamente nos países da região amazônica e nordeste do Brasil.
Através da realização desse projeto, os pesquisadores esperam dar início à formação de um grupo de pesquisa regional sul-americano sobre a temática da bioenergia (BIO10), além de chamar a atenção para o potencial de expansão dos biocombustíveis na matriz energética regional, através do incentivo a pesquisas na área. Em segundo plano, busca-se incentivar o desenvolvimento de técnicas e tecnologias sustentáveis, eficientes e inovadoras, que estejam em consonância com a perspectiva da integração regional sul-americana, notadamente nos países da região amazônica e nordeste do Brasil.
Minicurso sobre energias renováveis destaca painéis solares
Minicurso sobre energias renováveis destaca painéis solares
Estão abertas as inscrições para o minicurso de Energias Renováveis – Painéis Solares que o Grupo de Inovação Tecnológica da UFBA (Gitec) realiza nos dias 19 a 21 de julho, em parceria com a Escola Politécnica e a empresa NewCobras - Energias Alternativas e Poupança de Energia. As atividades, que têm apoio da Empresa Júnior de Engenharia Mecânica da UFBA, acontecem das 19 às 21h, na Escola Politécnica, onde as inscrições são feitas, no Núcleo de Serviços Tecnológicos. Os participantes com mais de 75% de freqüência receberão certificados. Mais informações estão disponíveis no endereço http://www.gitec.eng.ufba.br/outros/cursos/minicurso-de-energias-renovaveis.html. O formulário de inscrição também pode ser preenchido on line, no endereço eletrônico https://docs.google.com/spreadsheet/embeddedform?formkey=dFVsZjdsekx3NVNmYWlNS3FZczZJemc6MQ.
FONTE:WWW.UFBA.BR
Salvador sedia congresso nacional sobre uso racional de medicamentos
Salvador sedia congresso nacional sobre uso racional de medicamentos
O Ministério da Saúde, a Organização
Pan-Americana da Saúde, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária e a
Secretaria de Saúde do Estado da Bahia realizam de 12 a 15 de agosto, no
Centro de Convenções, a quarta edição do Congresso Brasileiro sobre Uso
Racional de Medicamentos – CBURM, que tem como tema central
“Incorporando o uso racional de nedicamentos no contexto da atenção à
saúde”.
O evento se constitui no maior
fórum multiprofissional brasileiro de discussão sobre o tema, promovido
pelo Comitê Nacional para a Promoção do Uso Racional de Medicamentos,
que tem o objetivo de promover uma ampla reflexão sobre as ações
necessárias à promoção do uso racional medicamentos no país, reunindo
profissionais e estudantes das diversas áreas da saúde, direito e
comunicação.
A ampla programação
inclui temas importantes que envolvem a prescrição, dispensação e
administração racional de medicamentos, saúde baseada em evidências,
qualidade e segurança na atenção à saúde, ensino e pesquisa com foco na
utilização de medicamentos, avaliação de tecnologias em saúde e acesso a
medicamentos, com a participação de palestrantes nacionais e
internacionais.
Inscrições e informações através do site www.congressourm.com.br
WWW.UFBA.BR
Bahia realiza congresso sobre diversidade sexual e de gênero
Bahia realiza congresso sobre diversidade sexual e de gênero
A Associação Brasileira de Estudos da
Homocultura (ABEH) realiza em Salvador, de 1 a 3 de agosto, o VI
Congresso Internacional de Estudos sobre a Diversidade Sexual e de
Gênero. Com o tema Memórias, rumos e perspectivas dos estudos sobre a diversidade sexual e de gênero, o evento vai reunir pesquisadores e ativistas de todo o mundo. A
edição baiana é a maior da história do Congresso, que já aconteceu em
Espírito Santo, Brasília, Minas Gerais, São Paulo e Rio grande do Norte.
O evento contará com o lançamento de 30 livros, no dia 2 de agosto, e
um show de encerramento, que será realizado no dia 3, às 21h, no
Pelourinho, com a cantora Márcia Short. A abertura ficará a cargo da
Drag Queen Divina Valéria. A programação artística também contará com
apresentação da artista Ana Dumas, com seu carrinho multimídia, no dia
1º, na Reitoria da UFBA.
Para o presidente
da ABEH, o professor da UFBA Leandro Colling, o número de propostas e
participantes indica o crescimento da produção nacional na área de
diversidade sexual e gênero e o maior interesse pelo debate público
sobre a temática. Cerca de 430 trabalhos de pesquisadores de diversos
países foram inscritos em sessões de comunicação e mesas coordenadas e
12 trabalhos na mostra artística. Ao todo haverá 10 eixos
temáticos: artes; comunicação, educação; histórias, sociabilidades e
etnografias; literatura; políticas; religiões; saúde; subjetividades; e
direitos. A programação completa já está disponível em http://www.abeh.org.br/.
FONTE: WWW.UFBA.BR
Texto: Cássia Candra
Foto: Gildo Lima
Ao anunciar para a próxima temporada a devolução ao mar da tartaruga de número 13 milhões, os oceanógrafos Guy Marcovaldi, 58, e Maria Ângela (Neca) Marcovaldi, 54, fundadores do Projeto Tamar, rebobinam o filme com imagens em preto e branco de um grupo de jovens formandos da Faculdade de Oceanografia da Universidade Federal de Rio Grande fazendo os primeiros movimentos para proteger e recuperar as populações das cinco espécies de tartaruga-marinha que ocorrem no Brasil. Em 1980, esses animais pré-históricos já integravam a lista das espécies em extinção e ainda não havia registro de qualquer trabalho de conservação marinha no País. Guy e Neca tinham vinte e poucos anos e não faziam ideia de que iriam ser reconhecidos como dois dos 50 heróis do planeta, pela revista Time, ao sustentarem a fundação de um dos mais bem-sucedidos projetos ecológicos do mundo. Três décadas depois, o Tamar – abreviatura para tartarugas-marinhas – reúne parceiros de peso e referenda um patrimônio importante mantido por uma senhora estrutura: a Fundação Pró-Tamar, encarregada da sustentação econômica do projeto; e o internacionalmente reputado Centro Brasileiro de Proteção e Pesquisa das Tartarugas-Marinhas, que cuida da parte científica. Há 32 anos Guy e Neca vivem em Praia do Forte, principal base nacional de proteção das tartarugas-marinhas. Ele se tornou coordenador nacional do projeto e ela presidente da fundação. O sonho virou uma inovadora empreitada de sucesso traduzida em números grandes que envolvem o trabalho de 1.300 pessoas em 23 bases instaladas em nove Estados voltadas para ações que resultam na proteção anual de 22 mil ninhos de tartarugas. Ganhador de prêmios importantes, como o J. Paul Getty – o Nobel do Meio Ambiente –, o projeto que mudou a relação das pessoas com as tartarugas parece não arrefecer diante de tempestades, como a que a Fundação Pró-Tamar enfrenta desde 2005, investigada por suspeita de improbidade administrativa.
Quais os números conquistados pelo Tamar nesses 32 anos?
Neca – Este ano, vamos anunciar 13 milhões de filhotes nascidos sob a proteção do Tamar. São 22 mil ninhos protegidos por ano, das cinco espécies de tartaruga, nas áreas de reprodução. Monitoramos 1.100 km de praia distribuídos em 23 bases em nove estados, e há ainda em torno de 1.300 pessoas que fazem parte da operação do Projeto Tamar com emprego direto e indireto.
Guy – Na próxima temporada, vamos festejar 15 milhões de visitantes.
Como vocês avaliam o patrimônio construído pelo Tamar?
Neca – É um patrimônio de todos. Muitas vezes, as pessoas esquecem que o Tamar é um projeto para os nossos filhos e netos, porque as tartarugas são recursos que estão há 150 milhões de anos no mundo. Não são de ninguém, especificamente, mas de todos. Então, o que avaliamos é que, em relação a um início de recuperação das populações, a uma melhora de conscientização das pessoas, a um entendimento maior, e maior respeito, com as tartarugas-marinhas, 32 anos ainda é muito pouco. Na vida de uma tartaruga-marinha, 30 anos é só uma primeira geração. Esse patrimônio, para sobreviver, vai precisar de muitos outros 30 anos.
O que ameaça as tartarugas hoje?
Neca – Agora, temos outros problemas. Tem a pesca desordenada, que aumentou muito (as tartarugas são capturadas incidentalmente e morrem); há redes demais na praia; tem muito desenvolvimento no litoral, que é uma coisa fácil de conciliar, desde que os empreendedores e as pessoas tenham consciência de que estão em uma área em que os dois lados têm que ceder. A última coisa, que ainda não se sabe como vai funcionar, é o aquecimento global.
Essas preocupações estão no foco do Tamar agora?
Guy – Sim. Mas eu gostaria de voltar àquela questão do patrimônio. Por trás das tartarugas existem pessoas. Quando chegamos aqui, encontramos os pais, seus filhos cresceram e eles viraram avós. Em 32 anos, passaram duas gerações humanas. O Tamar foi feito para proteger e pesquisar as tartarugas, mas tivemos que mudar a cabeça das pessoas.
O patrimônio seria essa transformação?
Guy – Transformação e educação. Mudou a cabeça das pessoas.
Neca – A transformação e a flexibilidade de se adaptar as coisas que vão acontecendo. O cenário há 32 anos era totalmente diferente. Então, fizemos um trabalho para resolver um problema que parcialmente foi resolvido (a coleta dos ovos e matança das fêmeas), e, depois disso, passaram a acontecer outras coisas, que estão ligadas à ocupação das praias, ao desenvolvimento.
Guy – No jargão da biologia, nós dizemos ‘uso não letal’. Antigamente o uso da tartaruga era letal, a população matava para viver dela. Hoje, as pessoas continuam vivendo da tartaruga, mas não precisam matar. Usam a imagem dela: o emprego que ela gera, a creche que ela consegue patrocinar…
Tartaruga vale mais viva que morta.
Guy – Essa é a tradução de ‘uso não letal’. O cenário mudou.
Neca – Além de ter mudado tudo, acho que, com o próprio aumento da comunicação no mundo, e com algumas tecnologias mais novas, nós (pessoas que trabalham com tartaruga no mundo) começamos a entender mais do ciclo de vida delas. Antigamente, não sabíamos quais eram as espécies que ocorriam no Brasil, qual o período de desova e as principais ameaças, não tínhamos nenhuma informação. E hoje, além dessas transformações, sobre as quais estávamos falando, tem um acúmulo de conhecimento.
O que levou o nome do Tamar para o mundo?
Neca – O diferencial do Tamar é que, enquanto a maioria dos programas do mundo, na época em que começamos, tratava só de pesquisa, o Tamar já estava fazendo educação ambiental e inclusão social. O Tamar foi superinovador na relação com as comunidades. E hoje, também, porque nosso banco de dados da parte de pesquisa é um dos poucos programas do mundo que têm essa extensão com os dados padronizados coletados com qualidade da mesma forma para que se possa fazer análise comparativa.
Que chega a 13 milhões de tartarugas.
Neca – É, resultado comprovado.
Como funciona a organização?
Guy – O Projeto Tamar é uma fusão do Centro Tamar (Centro Brasileiro de Proteção e Pesquisa das Tartarugas-Marinhas) com a Fundação Pró-Tamar. O Centro Tamar é vinculado ao Instituto Chico Mendes da Biodiversidade – ICMBio, órgão do Ministério do Meio Ambiente. O governo, junto com a fundação, que é uma entidade privada sem fins lucrativos, fez uma cooperação que é o Projeto Tamar. O projeto é tocado de forma integrada.
Os recursos vêm daí?
Neca – É, das duas fontes.
Em abril, veio à tona a informação de que há um processo na Justiça Federal, desde 2005, contra a Fundação Pró-Tamar. A ONG responsável pela captação de recursos para a sustentação econômica do Projeto Tamar estaria sendo investigada por suspeita de irregularidades na concessão do título de entidade de assistência social com objetivo de obter isenção de impostos. Qual a opinião de vocês a respeito?
Neca – Esse processo foi indeferido pelo juiz duas vezes. Não procede. Acho que todas as nossas atividades estão aí para dizer quem somos.
Vocês tinham vinte e poucos anos quando fizeram aquela foto da tartaruga morta cheia de ovos…
Neca – Foi no Atol das Rocas.
Até que ponto aquela ousadia ainda os move?
Neca – Ainda precisamos dela, porque a ousadia é diretamente proporcional aos problemas e desafios que a gente tem que enfrentar. As pessoas são a solução, mas também o maior problema. Então, você tem que ter muito equilíbrio entre esses dois extremos. O Tamar não existiria se não tivesse a adesão das pessoas, se não tivesse naquela época, intuitivamente, um mote, antes de se falar em educação ambiental e sustentabilidade, antes de se ter qualquer modelo teórico. Nós entendemos que a única forma de conseguir parar a coleta de ovos e a matança era fazer com que essas pessoas tivessem alguma alternativa. Isso continua acontecendo de outras formas. A gente hoje tem que trabalhar conciliando o desenvolvimento do litoral com o que é preciso para as tartarugas não se prejudicarem.
Como o desenvolvimento prejudica?
Guy – O principal problema das tartarugas-marinhas, nas praias, são as luzes artificiais. Para as tartarugas é letal, porque elas se orientam pela luz. Não conseguem encontrar o mar e acabam por morrer. Isso era uma coisa pontual, porque antes era uma vilazinha, mas, hoje, a população de tartarugas aumentou umas dez vezes, e as luzes, cem.
Neca – A ocupação gera impacto na praia. A população humana cresceu e a ocupação aumentou.
Guy – A distribuição de energia elétrica também cresceu muito.
Vocês estão aí com novos desafios.
Guy – É, mas tem umas coisas positivas. O governo da Bahia, há alguns anos, fez uma lei estadual proibindo iluminação de grande potência na praia. A lei, nos licenciamentos, é válida, os empreendimentos obedecem, mas as pessoas acham que isso é invenção de biólogo maluco.
Neca – Tem ainda legislação proibindo quadriciclos em área de desova.
E como o Tamar está lidando com isso?
Neca – Com educação, conscientização. É comprovar que isso acontece. Agora estamos com esses personagens, A Galera da Praia, falando sobre a luz. São várias formas de atingir o público: com ludicidade, por meio de uma palestra formal, indo às escolas, tentando atingir o maior número de pessoas possível. Você tem que, de alguma forma, aproximar as pessoas do problema. Uma coisa importante que protege as tartarugas no mundo é que todas as tartarugas-marinhas estão listadas como espécies ameaçadas de extinção. Mesmo que tenha melhorado a situação, elas não saíram da lista.
Qual foi a primeira lei?
Guy – A primeira lei dizia que era proibido matar e pegar ovo de tartaruga desovando. Quando começamos, estava sendo implantada e foi validada. Em seguida veio uma proteção mais dura, porque as tartarugas foram colocadas na lista dos animais em extinção.
Neca – Mas não adiantava ter leis se os pescadores não sabiam ler e não tinha ninguém para ensinar o que era aquilo.
Guy – Eles já sabiam que pegar ovo e matar tartaruga era proibido, mas nós propomos que ao invés de vendê-los no mercado eles os entregariam ao Tamar. Nós oferecemos carteiras de trabalho assinadas às lideranças dos pescadores.
Foi a ação mais importante do Tamar?
Guy – Foi um divisor de águas.
Neca – E como a gente sempre esteve muito numa frente de ação, tudo isso foi intuitivo. Não existia modelo teórico. Quando começamos a vender as camisetas do Tamar, algumas pessoas diziam que não era um projeto sério. E hoje é a nossa principal fonte de sustentação, que, aliás, não é nossa. Toda essa renda retorna para a própria comunidade. O Tamar não gera lucro. O que seria lucro numa empresa vai para ação de conservação que também emprega pessoas. E as camisetas como valor agregado trazem a mensagem de conservação e sensibilizam as pessoas nos grandes centros.
Quais atividades o Tamar realiza hoje?
Neca – Tem várias linhas de ação: monitoramento e pesquisa na áreas de reprodução, que são as praias; monitoramento e pesquisa nas áreas marinhas, que estão ligadas tanto à pesca quanto a algumas áreas de alimentação e repouso nos corredores migratórios; ações de educação ambiental e inclusão social; e ações dirigidas para diminuição da incidência da captura incidental na pesca. São as linhas básicas.
Como as tartarugas impactaram na vida de vocês?
Guy – A gente terminou a faculdade e começou a proteger as tartarugas. Nossa vida mudou quando fomos para a Praia do Forte.
Neca – O alicerce do Tamar foi comprovar para as pessoas dos lugares onde havia o problema que não era um bando de gente de outro lugar dando as regras e indo embora. Se não convivêssemos, não teríamos criado essa estrutura.
Guy – Os pescadores viram os nossos filhos nascerem e crescerem nesses lugares.
Neca – Não é fácil morar no paraíso. Há muitas limitações para criar um filho… No início, não tinha luz elétrica, telefone, não tinham 90% das condições que temos hoje.
Qual a mensagem que vocês acham que estão deixando?
Neca – Gosto de me referir ao ciclo das tartarugas. A gente aprendeu com elas que é preciso ter paciência para modificar alguma coisa.
Foto: Gildo Lima
Ao anunciar para a próxima temporada a devolução ao mar da tartaruga de número 13 milhões, os oceanógrafos Guy Marcovaldi, 58, e Maria Ângela (Neca) Marcovaldi, 54, fundadores do Projeto Tamar, rebobinam o filme com imagens em preto e branco de um grupo de jovens formandos da Faculdade de Oceanografia da Universidade Federal de Rio Grande fazendo os primeiros movimentos para proteger e recuperar as populações das cinco espécies de tartaruga-marinha que ocorrem no Brasil. Em 1980, esses animais pré-históricos já integravam a lista das espécies em extinção e ainda não havia registro de qualquer trabalho de conservação marinha no País. Guy e Neca tinham vinte e poucos anos e não faziam ideia de que iriam ser reconhecidos como dois dos 50 heróis do planeta, pela revista Time, ao sustentarem a fundação de um dos mais bem-sucedidos projetos ecológicos do mundo. Três décadas depois, o Tamar – abreviatura para tartarugas-marinhas – reúne parceiros de peso e referenda um patrimônio importante mantido por uma senhora estrutura: a Fundação Pró-Tamar, encarregada da sustentação econômica do projeto; e o internacionalmente reputado Centro Brasileiro de Proteção e Pesquisa das Tartarugas-Marinhas, que cuida da parte científica. Há 32 anos Guy e Neca vivem em Praia do Forte, principal base nacional de proteção das tartarugas-marinhas. Ele se tornou coordenador nacional do projeto e ela presidente da fundação. O sonho virou uma inovadora empreitada de sucesso traduzida em números grandes que envolvem o trabalho de 1.300 pessoas em 23 bases instaladas em nove Estados voltadas para ações que resultam na proteção anual de 22 mil ninhos de tartarugas. Ganhador de prêmios importantes, como o J. Paul Getty – o Nobel do Meio Ambiente –, o projeto que mudou a relação das pessoas com as tartarugas parece não arrefecer diante de tempestades, como a que a Fundação Pró-Tamar enfrenta desde 2005, investigada por suspeita de improbidade administrativa.
Quais os números conquistados pelo Tamar nesses 32 anos?
Neca – Este ano, vamos anunciar 13 milhões de filhotes nascidos sob a proteção do Tamar. São 22 mil ninhos protegidos por ano, das cinco espécies de tartaruga, nas áreas de reprodução. Monitoramos 1.100 km de praia distribuídos em 23 bases em nove estados, e há ainda em torno de 1.300 pessoas que fazem parte da operação do Projeto Tamar com emprego direto e indireto.
Guy – Na próxima temporada, vamos festejar 15 milhões de visitantes.
Como vocês avaliam o patrimônio construído pelo Tamar?
Neca – É um patrimônio de todos. Muitas vezes, as pessoas esquecem que o Tamar é um projeto para os nossos filhos e netos, porque as tartarugas são recursos que estão há 150 milhões de anos no mundo. Não são de ninguém, especificamente, mas de todos. Então, o que avaliamos é que, em relação a um início de recuperação das populações, a uma melhora de conscientização das pessoas, a um entendimento maior, e maior respeito, com as tartarugas-marinhas, 32 anos ainda é muito pouco. Na vida de uma tartaruga-marinha, 30 anos é só uma primeira geração. Esse patrimônio, para sobreviver, vai precisar de muitos outros 30 anos.
O que ameaça as tartarugas hoje?
Neca – Agora, temos outros problemas. Tem a pesca desordenada, que aumentou muito (as tartarugas são capturadas incidentalmente e morrem); há redes demais na praia; tem muito desenvolvimento no litoral, que é uma coisa fácil de conciliar, desde que os empreendedores e as pessoas tenham consciência de que estão em uma área em que os dois lados têm que ceder. A última coisa, que ainda não se sabe como vai funcionar, é o aquecimento global.
Essas preocupações estão no foco do Tamar agora?
Guy – Sim. Mas eu gostaria de voltar àquela questão do patrimônio. Por trás das tartarugas existem pessoas. Quando chegamos aqui, encontramos os pais, seus filhos cresceram e eles viraram avós. Em 32 anos, passaram duas gerações humanas. O Tamar foi feito para proteger e pesquisar as tartarugas, mas tivemos que mudar a cabeça das pessoas.
O patrimônio seria essa transformação?
Guy – Transformação e educação. Mudou a cabeça das pessoas.
Neca – A transformação e a flexibilidade de se adaptar as coisas que vão acontecendo. O cenário há 32 anos era totalmente diferente. Então, fizemos um trabalho para resolver um problema que parcialmente foi resolvido (a coleta dos ovos e matança das fêmeas), e, depois disso, passaram a acontecer outras coisas, que estão ligadas à ocupação das praias, ao desenvolvimento.
Guy – No jargão da biologia, nós dizemos ‘uso não letal’. Antigamente o uso da tartaruga era letal, a população matava para viver dela. Hoje, as pessoas continuam vivendo da tartaruga, mas não precisam matar. Usam a imagem dela: o emprego que ela gera, a creche que ela consegue patrocinar…
Tartaruga vale mais viva que morta.
Guy – Essa é a tradução de ‘uso não letal’. O cenário mudou.
Neca – Além de ter mudado tudo, acho que, com o próprio aumento da comunicação no mundo, e com algumas tecnologias mais novas, nós (pessoas que trabalham com tartaruga no mundo) começamos a entender mais do ciclo de vida delas. Antigamente, não sabíamos quais eram as espécies que ocorriam no Brasil, qual o período de desova e as principais ameaças, não tínhamos nenhuma informação. E hoje, além dessas transformações, sobre as quais estávamos falando, tem um acúmulo de conhecimento.
O que levou o nome do Tamar para o mundo?
Neca – O diferencial do Tamar é que, enquanto a maioria dos programas do mundo, na época em que começamos, tratava só de pesquisa, o Tamar já estava fazendo educação ambiental e inclusão social. O Tamar foi superinovador na relação com as comunidades. E hoje, também, porque nosso banco de dados da parte de pesquisa é um dos poucos programas do mundo que têm essa extensão com os dados padronizados coletados com qualidade da mesma forma para que se possa fazer análise comparativa.
Que chega a 13 milhões de tartarugas.
Neca – É, resultado comprovado.
Como funciona a organização?
Guy – O Projeto Tamar é uma fusão do Centro Tamar (Centro Brasileiro de Proteção e Pesquisa das Tartarugas-Marinhas) com a Fundação Pró-Tamar. O Centro Tamar é vinculado ao Instituto Chico Mendes da Biodiversidade – ICMBio, órgão do Ministério do Meio Ambiente. O governo, junto com a fundação, que é uma entidade privada sem fins lucrativos, fez uma cooperação que é o Projeto Tamar. O projeto é tocado de forma integrada.
Os recursos vêm daí?
Neca – É, das duas fontes.
Em abril, veio à tona a informação de que há um processo na Justiça Federal, desde 2005, contra a Fundação Pró-Tamar. A ONG responsável pela captação de recursos para a sustentação econômica do Projeto Tamar estaria sendo investigada por suspeita de irregularidades na concessão do título de entidade de assistência social com objetivo de obter isenção de impostos. Qual a opinião de vocês a respeito?
Neca – Esse processo foi indeferido pelo juiz duas vezes. Não procede. Acho que todas as nossas atividades estão aí para dizer quem somos.
Vocês tinham vinte e poucos anos quando fizeram aquela foto da tartaruga morta cheia de ovos…
Neca – Foi no Atol das Rocas.
Até que ponto aquela ousadia ainda os move?
Neca – Ainda precisamos dela, porque a ousadia é diretamente proporcional aos problemas e desafios que a gente tem que enfrentar. As pessoas são a solução, mas também o maior problema. Então, você tem que ter muito equilíbrio entre esses dois extremos. O Tamar não existiria se não tivesse a adesão das pessoas, se não tivesse naquela época, intuitivamente, um mote, antes de se falar em educação ambiental e sustentabilidade, antes de se ter qualquer modelo teórico. Nós entendemos que a única forma de conseguir parar a coleta de ovos e a matança era fazer com que essas pessoas tivessem alguma alternativa. Isso continua acontecendo de outras formas. A gente hoje tem que trabalhar conciliando o desenvolvimento do litoral com o que é preciso para as tartarugas não se prejudicarem.
Como o desenvolvimento prejudica?
Guy – O principal problema das tartarugas-marinhas, nas praias, são as luzes artificiais. Para as tartarugas é letal, porque elas se orientam pela luz. Não conseguem encontrar o mar e acabam por morrer. Isso era uma coisa pontual, porque antes era uma vilazinha, mas, hoje, a população de tartarugas aumentou umas dez vezes, e as luzes, cem.
Neca – A ocupação gera impacto na praia. A população humana cresceu e a ocupação aumentou.
Guy – A distribuição de energia elétrica também cresceu muito.
Vocês estão aí com novos desafios.
Guy – É, mas tem umas coisas positivas. O governo da Bahia, há alguns anos, fez uma lei estadual proibindo iluminação de grande potência na praia. A lei, nos licenciamentos, é válida, os empreendimentos obedecem, mas as pessoas acham que isso é invenção de biólogo maluco.
Neca – Tem ainda legislação proibindo quadriciclos em área de desova.
E como o Tamar está lidando com isso?
Neca – Com educação, conscientização. É comprovar que isso acontece. Agora estamos com esses personagens, A Galera da Praia, falando sobre a luz. São várias formas de atingir o público: com ludicidade, por meio de uma palestra formal, indo às escolas, tentando atingir o maior número de pessoas possível. Você tem que, de alguma forma, aproximar as pessoas do problema. Uma coisa importante que protege as tartarugas no mundo é que todas as tartarugas-marinhas estão listadas como espécies ameaçadas de extinção. Mesmo que tenha melhorado a situação, elas não saíram da lista.
Qual foi a primeira lei?
Guy – A primeira lei dizia que era proibido matar e pegar ovo de tartaruga desovando. Quando começamos, estava sendo implantada e foi validada. Em seguida veio uma proteção mais dura, porque as tartarugas foram colocadas na lista dos animais em extinção.
Neca – Mas não adiantava ter leis se os pescadores não sabiam ler e não tinha ninguém para ensinar o que era aquilo.
Guy – Eles já sabiam que pegar ovo e matar tartaruga era proibido, mas nós propomos que ao invés de vendê-los no mercado eles os entregariam ao Tamar. Nós oferecemos carteiras de trabalho assinadas às lideranças dos pescadores.
Foi a ação mais importante do Tamar?
Guy – Foi um divisor de águas.
Neca – E como a gente sempre esteve muito numa frente de ação, tudo isso foi intuitivo. Não existia modelo teórico. Quando começamos a vender as camisetas do Tamar, algumas pessoas diziam que não era um projeto sério. E hoje é a nossa principal fonte de sustentação, que, aliás, não é nossa. Toda essa renda retorna para a própria comunidade. O Tamar não gera lucro. O que seria lucro numa empresa vai para ação de conservação que também emprega pessoas. E as camisetas como valor agregado trazem a mensagem de conservação e sensibilizam as pessoas nos grandes centros.
Quais atividades o Tamar realiza hoje?
Neca – Tem várias linhas de ação: monitoramento e pesquisa na áreas de reprodução, que são as praias; monitoramento e pesquisa nas áreas marinhas, que estão ligadas tanto à pesca quanto a algumas áreas de alimentação e repouso nos corredores migratórios; ações de educação ambiental e inclusão social; e ações dirigidas para diminuição da incidência da captura incidental na pesca. São as linhas básicas.
Como as tartarugas impactaram na vida de vocês?
Guy – A gente terminou a faculdade e começou a proteger as tartarugas. Nossa vida mudou quando fomos para a Praia do Forte.
Neca – O alicerce do Tamar foi comprovar para as pessoas dos lugares onde havia o problema que não era um bando de gente de outro lugar dando as regras e indo embora. Se não convivêssemos, não teríamos criado essa estrutura.
Guy – Os pescadores viram os nossos filhos nascerem e crescerem nesses lugares.
Neca – Não é fácil morar no paraíso. Há muitas limitações para criar um filho… No início, não tinha luz elétrica, telefone, não tinham 90% das condições que temos hoje.
Qual a mensagem que vocês acham que estão deixando?
Neca – Gosto de me referir ao ciclo das tartarugas. A gente aprendeu com elas que é preciso ter paciência para modificar alguma coisa.
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