Jogo de empurra no governo prejudica coleções biológicas
REINALDO JOSÉ LOPES
RICARDO MIOTO
DE SÃO PAULO
Um jogo de empurra entre o Ministério da Ciência e Tecnologia e o do Meio Ambiente está emperrando a criação de uma política nacional para as coleções biológicas, principal registro da biodiversidade do país.
O incêndio da coleção de serpentes e aracnídeos do Instituto Butantan, no mês passado, chamou a atenção para o risco de catástrofes parecidas Brasil afora, já que outras coleções antigas e importantes também não contam com sistemas confiáveis de proteção contra incêndio.
Apesar desse temor, contudo, uma resolução da Conabio (Comissão Nacional de Biodiversidade) que criaria uma câmara técnica permanente para gerenciar as coleções biológicas brasileiras permanece sem ser implementada desde 2008.
"A implementação das propostas aguarda a decisão do MCT de finalmente dar uma maior atenção a esse assunto", disse à Folha Braulio Ferreira de Souza Dias, diretor de conservação da biodiversidade do MMA.
Logo depois do desastre no Butantan, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, escreveu ao ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, pedindo mais ações em favor das coleções biológicas. Teixeira perguntava, na missiva, "quantos outros butantans o país perderá antes de acordar".
Para Luiz Antonio Barreto de Castro, secretário de políticas e programas de pesquisa e desenvolvimento do MCT, "coleções biológicas têm sido prioridade do ministério. E agora a gente fica recebendo e-mails de pessoas dizendo 'Será que, depois do que aconteceu, o MCT vai dar atenção para as coleções?'. O MCT sempre deu atenção".
Ele afirma que os recursos do MCT "não têm dado conta" de todos os acervos do país. Falta apoio dos outros ministérios, diz. "É uma conta muito grande para se pagar sozinho."
Condições precárias
Enquanto o impasse se mantém, os principais museus do país alertam que o risco de incêndio em seus prédios não é muito diferente do que havia no Butantan. Os vidros com álcool, bem como plantas ou invertebrados secos, resultam num ambiente muito inflamável.
Hussam El Dine Zaher define como "precárias" as condições do Museu de Zoologia da USP, que dirige. São 10 milhões de exemplares de animais no local.
O museu, conta ele, debelou um incêndio recente na sua coleção de peixes. Há um projeto de R$ 7 milhões para construir um novo prédio.
Nilson Gabas Júnior, do Museu Paraense Emílio Goeldi, e Adalberto Val, do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), apontam a necessidade uma política nacional para os acervos.
Para ambos, mesmo medidas mais modestas que sistemas de gás carbônico (que retiram o oxigênio do prédio e, assim, debelam o fogo), como detectores de fumaça e calor e armários compactados, podem minimizar os riscos que as coleções correm.
No Butantan, acredita-se que já foi possível recuperar 40% do acervo original. Mas o trabalho de restauração deve continuar por alguns meses. Esse número, então, ainda deve subir
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