25 de novembro de 2013

Nova espécie de morcego da Mata Atlântica homenageia o Dr. Adriano Peracchi e revela outra espécie do Cerrado que pode estar criticamente ameaçada

Nova espécie de morcego da Mata Atlântica homenageia o Dr. Adriano Peracchi e revela outra espécie do Cerrado que pode estar criticamente ameaçada

22 10 2013

FONTE: http://sbeq.wordpress.com/2013/10/22/nova-especie-de-morcego-da-mata-atlantica-homenageia-o-dr-adriano-peracchi-e-revela-outra-especie-do-cerrado-que-pode-estar-criticamente-ameacada/#more-306

 
Os morcegos do gênero Lonchophylla (Phyllostomidae, Lonchophyllinae) compreendem espécies nectarívoras neotropicais de pequeno a médio porte (< 20 g). Em adaptação à nectarivoria, esses morcegos possuem o crânio e focinho bastante alongados e língua longa e extensível (algumas espécies nectarívoras são observadas adejando bebedouros de beija-flores). A maioria das espécies de Lonchophyllinae ocorre do Peru ao norte da América do Sul, ao longo dos Andes. Apenas três espécies—L. bokermanni, L. dekeyseri e L. mordax—distribuem-se ao longo da costa leste da América do Sul. Dentre essas, acreditava-se que L. bokermanni (descrita em 1978, em homenagem ao zoólogo Werner Carl August Bokermann) ocorria no Cerrado (sua localidade tipo) e na Mata Atlântica do sudeste do Brasil. Entretanto, um recente trabalho sobre a variação geográfica de L. bokermanni revelou que as populações da Mata Atlântica possuem uma identidade distinta das populações do Cerrado, correspondendo a uma nova espécie, denominada pelos autores Lonchophylla peracchii (Dias et al. 2013; A new species of Lonchophylla from the Atlantic Forest of southeastern Brazil, with comments on L. bokermanni. Zootaxa 3722(3):347–360).


A homenagem
Essa nova espécie de morcego homenageia a eminente carreira do Dr. Adriano Lúcio Peracchi; mastozoólogo, entomólogo, acarologista, sócio fundador e honorário e ex-presidente da SBZ, sócio fundador da Sociedade Brasileira de Mastozoologia e sócio fundador e honorário da Sociedade Brasileira para o Estudo de Quirópteros. Desde 1960, o Dr. Adriano publicou mais de 90 artigos científicos, 33 capítulos de livro e nove livros sobre mastozoologia, entomologia e acarologia no Brasil; contribuindo ainda na formação de dezenas de zoólogos de, pelo menos, quatro diferentes gerações. Dentre seus trabalhos, destacam-se estudos sobre a taxonomia e história natural de coleópteros Cleridae e Cerophytidae e de ácaros Spelaeorhynchidae; os trabalhos pioneiros sobre a quiropterofauna dos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo e Amapá; os trabalhos sobre distribuição, comportamento, bionomia e história natural de diversas espécies de morcegos; as séries de livros sobre mamíferos, primatas e morcegos do Brasil e a recente descrição de um novo gênero e espécie de morcego nectarívoro—Dryadonycteris capixaba (Phyllostomidae, Glossophaginae). Além de suas publicações, o Dr. Adriano Peracchi criou e atua como curador de uma importante coleção de Chiroptera da América do Sul, depositada na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, instituição onde leciona desde 1962 e onde já ocupou os cargos de diretor do Instituto de Biologia, vice-reitor e reitor.

Mais de 40 anos depois de ter sido iniciado na quiropterologia pelos Drs. Eugênio Izecksohn e Bernardo Villa Ramirez, o Dr. Adriano Peracchi continua com sua imbatível paixão por morcegos, e seus atuais projetos envolvem estudos em coleções pelo Brasil e exterior, além de trabalhos de campo. Atualmente, o 
Dr. Adriano coordena um projeto com amostragens periódicas na Reserva Natural Vale, em Linhares, ES, onde participa de todas as atividades de campo.

Mais uma espécie de mamífero brasileiro ameaçada
A distribuição de Lonchophylla peracchii cobre 500 km de floresta atlântica, abrangendo diferentes habitats (ilhas continentais, florestas sazonais e perenes e formações pioneiras); e a área de distribuição dessa espécie pode duplicar ou mesmo triplicar após a reidentificação de alguns espécimes coletados mais ao norte. Por outro lado, após a identificação das populações da Mata Atlântica como L. peracchii, L. bokermanni passa a estar restrita a apenas três localidades bastante próximas (ca. 150 km) no Cerrado; um bioma considerado hotspot de diversidade devido à alta concentração de espécies endêmicas e excepcional perda de habitat.
Após a descrição de L. peracchii há pouca informação disponível sobre a história natural de L. bokermanni. Sabemos apenas que essa espécie ocorre em duas localidades do Cerrado, forrageia em áreas abertas, alimenta-se de pólen, néctar e insetos, e poliniza duas plantas, Encholirium subsecundum (uma bromeliácea saxícola terrestre) e Bauhinia rufa (uma leguminosa arbustiva). Além disso, em um estudo de cinco dias conduzido em 1987, L. bokermanni foi a única espécie de morcego necatrívoro que se alimentou em flores de E. subsecundum (Sazima et al. 1989; Bat pollitation of Encholirium glaziovii, a terrestrial bromeliad. Pl. Syst. Evol. 168:167–179). Essa bromeliácea, que é endêmica de uma pequena área do Cerrado de Minas Gerais, ocorre em formações rochosas entre 550 e 1400 m de altitude (Versieux and Wendt 2006; Checklist of Bromeliacea of Minas Gerais, Brazil, with notes on taxonomy and endemism. Selbyana 27:107–146), enquanto B. rufa ocorre em savanas e florestas secas (Lopez-Poveda 2012; Bauhinia rufa. In: IUCN Red List of Threatened Species 2013).
Devido à elevada perda de habitat de Cerrado, o futuro de L. bokermanni é incerto e mais pesquisas são necessárias para tentarmos entender um pouco melhor a distribuição e história natural dessa espécie. Se pesquisas adicionais confirmarem L. bokermanni como polinizador específico (ou como um dos principais polinizadores) de E. subsecundum, essa bromeliácea endêmica também pode estar ameaçada; nesse caso, ambas as espécies (o morcego e a bromeliácea) merecerão a atenção de conservacionistas. Recomendamos fortemente esforços adicionais de captura na área de distribuição de E. subsecundum e outras de espécies próximas (e.g., E. biflorum, E. bradeanum, E. heloisae, E. magalhaesii, E. pedicellatum, E. reflexum, E. scrutor, E. vogelii) para obtermos informações adicionais sobre a biologia e requerimentos de habitat de L. bokermanni, o que servirá de background para qualquer plano de conservação desse morcego.
Lonchophylla peracchii é a quinta espécie de morcego descrita por Ricardo Moratelli e a terceira descrita por Daniela Dias, ambos da Fundação Oswaldo Cruz e lideres desse estudo. Outras espécies já descritas por esse time incluem Myotis diminutus Moratelli & Wilson, 2011 do Equador (criticamente ameaçada ou provavelmente extinta) e Myotis lavali Moratelli, Peracchi, Dias & Oliveira, 2011 do Brasil e Paraguai (depositada em museus por mais de 100 anos até ser formalmente reconhecida como uma espécie distinta).
Ricardo Moratelli

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