Sede no Imbuí está fechada para visitações desde 2010. Transferência para Parque Tecnológico é criticada pela comunidade acadêmica
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victorialiboriosimoes@gmail.com
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Dezenas
de equipamentos utilizados para popularizar a ciência entre jovens
baianos encontram-se amontoados no saguão do Museu de Ciência e
Tecnologia (MC&T), na Boca do Rio, a espera do remanejamento do
acervo técnico e patrimonial mobiliário para o Parque Tecnológico da
Bahia, na Avenida Paralela. O destino do material, que inclui
experimentos e jogos utilizados para a compreensão de disciplinas como
física, química e biologia, foi determinado pelo Decreto Estadual nº
14.719, de 26 de agosto de 2013.
Dentre outras resoluções, o documento
estabelece a transferência de titularidade administrativa do Museu para a
Secretaria de Ciência, Tecnologia & Inovação (Secti).
De acordo com o decreto, todo o
acervo deveria ser transferido em um prazo de 180 dias, mas nenhuma
medida foi tomada para realizar a mudança do material, cujo prazo expira
em fevereiro. Diante da decisão, os membros da comunidade científica
baiana atentam para a necessidade de manutenção do museu no seu local
original, a fim de preservar a história da instituição, considerada
pioneira na América Latina.
Em defesa de um movimento pela
revitalização do museu da Boca do Rio, representantes da Associação
Brasileira de Centros e Museus de Ciência (ABCMC), Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência – Seccional Bahia (SBPC-BA) e Academia de
Ciências da Bahia (ACB) se uniram para sensibilizar a sociedade diante
da importância estratégica de um museu de ciência e tecnologia no
Estado.
Na opinião do professor Nelson
Pretto, secretário regional da SBPC, o fechamento de uma estrutura
histórica como o MC&T configura falta de visão política. “Deveria
haver uma revogação imediata do decreto e um anúncio em altas praças de
que o Governo do Estado apoia a restauração e reabertura da
instituição”, afirma. Para ele, a retirada de setores administrativos da
Universidade do Estado da Bahia (Uneb), que atualmente ocupam espaços
no museu, deve ser feita com o propósito de retomar o projeto original
de 1977.
O professor defende que a
implementação de outros equipamentos como aquários, planetários,
laboratórios públicos são essenciais ao estado. “Esses espaços são
extremamente necessários para que se crie uma cultura científica no
estado, bem como para a formação de uma visão crítica sobre C&T
entre os cidadãos”.
Ainda no que se refere à
construção de outro museu no Parque Tecnológico, cujo projeto está sendo
capitaneado pela Secti, Nelson Pretto foi categórico: “Se a secretaria
afirma que vai construir um novo e revitalizar o existente, ótimo! A
SBPC o apoiará inteiramente. Mas não tem sentido abandonar uma estrutura
pronta para começar outra do zero”, analisa.
Para o presidente da ACB, Roberto
Santos, a situação atual do museu é lamentável. “O sucateamento do
acervo e da estrutura, construída originalmente para abrigar um museu de
ciência e tecnologia, demonstram o descaso político de diversos
governos”, diz. “Tenho certeza de que a juventude perde e continua
perdendo com a ausência de um espaço como esse, que incentiva a educação
científica na Bahia, que vai mal das pernas”, completa.
Fechado para visitação de
escolares desde 2010, devido a uma reforma nos cabos que sustentam o
teto, o museu foi perdendo ao longo dos anos o seu objetivo inicial.
Este fato preocupou o presidente da Associação Brasileira de Centros e
Museus de Ciência (ABCMC), Carlos Wagner. “Estamos preocupados com o
sucateamento do Museu de Ciência & Tecnologia da Bahia”, afirma.
Para ele, desativar um museu que fez história contraria as expectativas
sobre a vontade do Estado em ser referência em ciência e tecnologia no
Brasil.
De acordo com o diretor do
MC&T, Jorge Teixeira, o fechamento das atividades no museu tem
impossibilitado a visita de escolas que tradicionalmente mantinham a
atividade inserida nos seus planejamentos pedagógicos. Segundo os
registros institucionais, a taxa média de visitação era de cinco mil
pessoas ao ano, entre grupos escolares e visitas espontâneas, sem contar
os números de solicitações atendidas pelo ônibus Ciência Móvel.
Ao ser questionado sobre futuro
do museu, o ex-reitor da Uneb, Lourisvaldo Valentim, afirma que o acordo
estabelecido com o secretário Paulo Câmera seria de que a Secti levaria
apenas o nome “Museu de Ciência e Tecnologia da Bahia”, e não o acervo
ou equipamento, como está descrito no decreto. Valentim, que encerrou
sua gestão como reitor, não soube dizer o que será feito com as
instalações do museu, que hoje é ocupado por duas pró-reitorias da
universidade.
Durante a entrevista, Valentim
ressaltou que um dos principais motivos que levaram o museu a diminuir
as atividades ofertadas para a população foi o fato de que a manutenção
dos custos deste equipamento para a Uneb se tornou onerosa. “Para nós
era uma despesa um tanto grande, porque precisava pagar pessoal e
empresa terceirizada”, disse. O ex-reitor também chamou a atenção para a
falta de pessoal qualificado. “Precisaríamos contratar pessoal
especializado na área de popularização da ciência, chegamos a solicitar
diversas vezes a abertura de concurso público, mas não fomos bem
sucedidos”.
Procurado por cinco vezes, o
secretário da Secti, Paulo Câmera, não concedeu entrevista. No entanto,
sua assessoria de imprensa informou que existem dois projetos
educacionais em andamento: o Espaço Interativo Mundo da Ciência,
localizado no Parque Tecnológico, orçado em 18 milhões de reais, e o
Espaço Interativo da Ribeira, cuja pretensão é funcionar no mesmo local
do Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC), abrigando também um Centro
Digital de Cidadania (CDC). De acordo com a Secti, o galpão localizado
na
Cidade Baixa encontra-se em reforma e os experimentos já foram
licitados e comprados, com previsão para entrega para abril deste ano. O
investimento foi de R$ 7 milhões de reais, tendo vencido a licitação a
empresa Ciência Prima, de São Paulo.
MUSEU
Os museus são, em sua natureza,
instituições promotora da memória, e devem estar a serviço da sociedade,
tendo como princípio o exercício da educação na base de sua missão. São
cerca 190 espaços de popularização de ciência espalhados pelo país como
museus, zoológicos, aquários, planetários, observatórios e jardins
botânicos, que mantêm uma programação variada para todas as faixas
etárias.
Com a proposta de estimular o
interesse da população pelo conhecimento, os Centros e Museus de Ciência
ganham cada vez mais importância no ensino e divulgação científica e
tecnológica, em que as teorias são demonstradas na prática por
experimentos e exercícios através dos equipamentos que fazem parte do
patrimônio da instituição.
PIONEIRISMO
O Museu de Ciência e Tecnologia
da Bahia foi pioneiro na América Latina e serviu de modelo para
instituições semelhantes em São Paulo e Rio Grande do Sul. Os
profissionais contratados da época foram enviados à Londres para
aprender como fazer um museu de ciência e tecnologia na Bahia. Com o
apoio do Conselho Britânico, instituição do Reino Unido de fomento a
países em desenvolvimento durante a Guerra Fria, um dos diretores do
museu da categoria veio ao Brasil para a concepção e implantação dessa
forma didática e agradável de aprender coisas acerca da ciência e
tecnologia.
Segundo a Associação Brasileira
de Centros e Museus de Ciência (ABCMC), são mais de 200 instituições
associadas, distribuídas em todas as regiões do Brasil. No entanto, a
maioria está concentrada nas capitais e grandes cidades, que é resultado
de uma educação esquecida ao longo de mais de 100 anos. A Bahia tem
mais de 14 milhões de habitantes. O número de museus e espaços culturais
são insuficientes. “Precisamos de uma revolução e ocupar espaços
ociosos no estado”, diagnostica o presidente Carlos Wagner Costa Araújo,
diretor do Espaço Ciência e Cultura da Universidade Federal do Vale do
São Francisco (UNIVASF).
Dados que comprovam o mau
desempenho do estudante brasileiro nas áreas de ciências podem ser
facilmente encontrados em exames internacionais e nacionais, como o
Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes (PISA) e o Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM), respectivamente, que mostram a carência
de uma formação sólida dos brasileiros na área. Os dois sistemas de
avaliação são categóricos ao afirmar que a formação não se dá somente na
sala de aula, mas também em espaços não formais de ensino.
Outra pesquisa, sobre Percepção
Pública da Ciência e Tecnologia na Bahia, encomendada ao Datafolha pela
Academia de Ciências da Bahia, realizada com 404 pessoas, revela que a
visita à museus e exposições não são hábitos frequentes registrados
pelos baianos. A busca por informações sobre a temática está concentrada
em programas e documentários na televisão, seguido de Internet, jornais
e conversa entre amigos. A pesquisa do Datafolha conclui que há
interesse por C&T na Bahia, porém existem dificuldades para obtenção
de informações sobre o assunto, seja pela falta de preparo na escola ou
pela falta de interesse sobre o tema na mídia geral.
HISTÓRIA
Inaugurado em 1979, durante o
governo de Roberto Santos, o Museu de Ciência e Tecnologia da Bahia
(MC&T) abriu um espaço para que a população baiana pudesse conhecer
as peculiaridades da ciência por meio de equipamentos e experiências. Ao
longo desses anos o museu vem sendo esvaziado, de forma que também
esteve fechado por anos e foi reaberto somente em 1997. Xadrez gigante,
canoa, esqueletos, armários e outros equipamentos se encontram
amontoados no centro do salão. Já os aparelhos para experimentos de
eletricidade e química estão em uma sala a parte ensacados a espera do
transporte. A falta de engajamento dos líderes durante as mudanças
políticas, trocas de cargos nas secretarias e questões relacionadas com
prioridade e vontade política para sua manutenção e funcionamento são
apontados como grande fator para o sucateamento de um equipamento
histórico de memória do primeiro Museu de C&T da América Latina.
Ex-governador Roberto Santos foi
idealizador do projeto na Bahia. Para ele, a sociedade baiana viviam um
moemnto de efervecência, saindo de uma sociedade agrária para industrial
e precisava de um campo de especialização na área. “Além de ser um
museu educativo, também se dedicaria a atividade e desenvolvimetno
cientifico e tecnologico, que também servisse de base de inovação para a
industria petroquimica”. Segundo o professor de medicina aposentado da
UFBA, um dos parceiros foi o Conselho Britânico, enquanto a Inglaterra
vivia uma época de riqueza econômica muito grande e criou esse conselho
para investir em países em desenvolviemento. Para isso, trouxe um dos
diretores do museu de C&T de Londres para concepção e implantação
dessa forma didática e agradável de aprender coisas acerca da ciência e
tecnologia aqui na Bahia.
Ex-diretor do museu e professor
aposentado de física da UFBA Fernando Santana foi um dos especialistas
enviados à Londres na década de 1970 para aprender no Museu de C&T
britânico como formas um campo de divulgação científica de forma lúdica.
Para ele, esse abandono do equipamento é uma situação problemática, já
que os museus despertam o interesse dos jovens pela ciência e deve ser
de amplo acesso a todos. “A visitação de museus semelhantes, como na
Noruega, Suécia e Estados unidos da América, é feita de forma
espontânea”, explicou. Para ele, em vez dos jovens passearem pelas ruas,
shoppings, ou ficarem desocupados, visitam e se divertem nos museus.
“Uma realidade contrária à situação baiana”, analisou.
Ainda este ano, a Academia de
Ciências da Bahia encomendou uma pesquisa para o Datafolha acerca da
opinião da população da cidade de Salvador sobre aspectos relativos à
Ciência e Tecnologia, além de identificar alguns comportamentos adotados
pela população em relação ao tema. Por meio de 404 entrevistas, a
pesquisa revela que entre os hábitos de informação sobre C&T,
assitir programas e documentários na televisão é o que tem maior
destaque, seguido de internet, jornais e conversa entre amigos. O mais
surpreendente está no fato de que a visita à museus e exposições com
esse fim foram hábitos pouco frequentes registrados na pesquisa. A
pesquisa do Datafolha então conclui, que “ há interesse por C&T,
porém alguma dificuldade para obtenção de informações sobre o assinto,
seja pela falta de preparo na escola ou pela falta de interesse sobre o
tema na mídia geral”.
Dados internacionais, como o
Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes (PISA), e nacionais,
como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), mostram a carência de uma
formação sólida dos brasileiros, pricipalemente em ciências, em que essa
formação não se dá somente na sala de aula. Para o pesquisador da
Faculdade de Educação da UFBA, Nelson Pretto, outros equipamentos além
de museus, como aquários, planetários, laboratórios públicos de ciência e
tecnologia seriam essenciais. “Aqui na Bahia somos privilegiados
cientificamente falando, porque a articulação entre Ciência, Tecnologia e
Cultura é fenomenal, de uma riqueza monstruosa”, explica.
“Temos muitas peças, distribuídas
na parte interna e externa e outras projetadas aguardando verba para
execução”, explica Teixeira. Mas o diretor faz questão de lembrar que a
Uneb vem dando uma importante contribuição, sem a qual não seria
possível o funcionamento. “Indo para outra secretaria ficaríamos a
deriva e sem rumo, aos sabores de quem ocupar o cargo de secretario”.
De acervo permanente, o museu tem
os equipamentos de transporte como a locomotiva, o avião e o carro de
boi e os experimentos de física, química, biologia. Além disso, tem
coisas do cotidiano que possam passar algum conhecimento ligados a
ciência, como por exemplo, o consumo de equipamentos de uso domésticos
como chuveiro elétrico, lâmpadas entre outros. Já quanto as exposições
temporárias, estas geralmente vêm de outros centros e museus, mas também
o que é feito pela indústria e universidades da Bahia.
Segundo os registros de visitação
do museu, existe uma média de 5 mil visitantes com agendamento de
escolas e grupos por ano e aproximadamente a mesma quantidade de visitas
expontâneas. “Com o ônibus temos aproximadamente 6000 pessoas
atendidas, estes valores estão aproximados, pois temos dificuldade de
registrar o movimento de circulação, sendo a quantidade de visitantes no
interior muito superior da que esta apresentada”, explica Teixeira.
*Estudante de Comunicação Social – habilitação em Jornalismo e estagiária da Agência de Notícias em CT&I
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