17 de outubro de 2013

Megaestudo de DNA revela semelhanças entre tumores

Folha de S. Paulo


REINALDO JOSÉ LOPES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
 
Num conjunto monumental de estudos, que envolveu análises de DNA de quase 8.000 tumores e dezenas de tipos diferentes de câncer, uma equipe internacional de pesquisadores afirma ter dado passos importantes para chegar a tratamentos mais racionais contra a doença.
Ou melhor, "as doenças", já que os médicos sabem há tempos que, quando se trata de câncer, cada caso é um caso. O principal achado das novas pesquisas, no entanto, é que muitas vezes tumores de órgãos totalmente diferentes --um localizado na garganta e outro na bexiga, por exemplo-- podem ter perfil genético surpreendentemente parecido.
"Com isso, os oncologistas poderiam aplicar tudo o que eles sabem a respeito do tratamento de certos tumores de cabeça e pescoço aos 10% dos cânceres de bexiga que têm as mesmas características, por exemplo", explica Josh Stuart, professor de engenharia biomolecular da Universidade da Califórnia em Santa Cruz que é um dos autores da nova batelada de pesquisas sobre o tema.
Da mesma maneira, dizem os pesquisadores, quando novas drogas anticâncer forem testadas, às vezes fará mais sentido agrupar os pacientes pelas alterações no DNA de suas células tumorais, "projetando" remédios que neutralizem essas alterações, e não separar pacientes por órgão afetado pela doença.
Os artigos científicos são produto do projeto internacional conhecido como TCGA (sigla inglesa de Atlas do Genoma do Câncer) e estão saindo na edição de outubro da revista científica "Nature Genetics". Até 2015, a meta do TCGA é analisar um total de 10 mil tumores, ligados a 25 tipos de câncer.
PODER ESTATÍSTICO
As descobertas do projeto só estão sendo possíveis graças aos avanços recentes na tecnologia de "leitura" do DNA, hoje cada vez mais barata e rápida. Com isso, os pesquisadores conseguem tanto obter enorme quantidade de dados brutos quanto usar técnicas estatísticas sofisticadas para achar correlações entre eles.
Um dos principais desafios nesse sentido é justamente achar as agulhas no palheiro genômico do câncer, digamos. Uma célula normal só vira cancerosa por causa de alterações em seu DNA, as quais a levam a se multiplicar de maneira desenfreada e formar tumores.
Mas o problema é que nem sempre fica clara a diferença entre as alterações no DNA consideradas as "motoristas" do câncer, ou seja, as responsáveis por desencadear a formação de tumores, e as "passageiras", que são resultado de acidentes do funcionamento das células tumorais, mas não têm esse mesmo poder destrutivo.
Os novos trabalhos avançam nessa direção, mostrando algumas coisas curiosas. Parece que existem duas grandes categorias de cânceres. Uma delas está ligada principalmente a mutações no DNA que envolvem trocas de "letras" químicas. Outras parecem ter mais a ver com alterações no número de cópias de genes - em vez de ter duas cópias de um determinado gene, como seria normal, por exemplo, as células cancerosas têm só uma, ou três, ou mais ainda.
O que é ainda mais bizarro, um dos estudos do grupo, liderado por Rameen Beroukhim, da Universidade Harvard, mostrou que quase 40% dos tumores possuem duplicações do genoma inteiro - em resumo, possuem duas vezes mais material genético que uma célula normal.
Esse e outros dados indicam que um dos fatores mais importantes para o surgimento do câncer pode ser uma falha no "empacotamento" do DNA no núcleo da célula, formando a chamada cromatina, um novelo de DNA mais proteínas. Esse parece ser um alvo "quente" para pesquisas futuras, dizem os cientistas.

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